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Olá ignorante…

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Blindfolded man. Autor:Tim Teebken

– Olá Ignorante!
– Como estás Idiota?
– Olha, nada bem para dizer verdade. Então não é que encontrei ontem o Parvo.
– E então?
– Olha… chamou-me burro.
– A sério?
– Sim!
– Isso não se faz. Nem mesmo a ti!
– O que queres dizer com isso?
– Nada, nada. Estava a pensar alto.
– E tu Ignorante, que boas notícias trazes?
– Comigo tudo bem amigo, nunca pior. Estou a passar por uma boa fase. Ignoro mais do que nunca. Ignoro tudo e todos, até a mim mesmo… vê lá!
– Mas isso é fantástico. Como consegues? Fogo, como queria ser como tu!
– Obrigado amigo. As tuas palavras, como deves imaginar, não valem nada para mim. Obrigado.
– Sim, eu sei. Mas ainda assim penso que é fantástico. Olha… conta-me lá como consegues ignorar a ti próprio.
– Está bem. Eu dou-te um exemplo. Ontem, depois do trabalho, ia eu de regresso a casa quando decidi passar pela taberna, sabes, para ignorar mais um copo. Antes de entrar olho a vitrine e quem é que eu vejo?
– O Parvo!
– Ó Idiota, estás a ser como o Ridículo agora.
– Desculpa, desculpa… Olha lá, por falar no Ridículo, sabes como ele está?
– Sim. Vi-o na semana passada agarrado ao Triste e ao Pobre. Enfim, continua igual a ele próprio. Mas voltando à minha história. Olhei a vitrine e reparei no meu reflexo espelhado no vidro. Fiquei imóvel por alguns momentos, a olhar-me, ajustando a gravata, e, acima de tudo, tentando avaliar a mensagem que a minha postura transmitia. Confiança, seriedade, bom gosto, uma nota leve de humor, de certo responsabilidade e, como seria de esperar, inteligência. Decidi então elevar a minha ignorância para outro patamar e ignorar o meu reflexo, sabes, partir sem ele, abandona-lo na vitrine da taberna
– E resultou?
– Sim. Comecei por me movimentar devagar ao início, sempre fixando nos olhos no meu reflexo mas demonstrando desapego. Depois ignorei-o ainda mais e descolei-me completamente dele. Um pouco tal e qual se descola a parte traseira de um autocolante. Primeiro descolei os meus membros, depois o tronco e por fim a cabeça. O meu reflexo permaneceu imóvel na vitrine e eu retomei o meu caminho para casa. Olhei para a vitrine da loja seguinte, a sapataria, mas nada transpareceu. Percorri o resto da rua em cada vitrine confirmei que o meu reflexo ficara para trás.E foi assim que me ignorei, assim, a mim próprio!
– Fantástico! O Parvo ficará muito contente.
– Ó Idiota… mas qual é a tua paranoia hoje com o Parvo?
– É que ontem eu e o Parvo estávamos na taberna quando te vimos chegar. Ele queria pagar-te um copo e foi até à vitrine fazer-te sinal para entrares. Como tu ignoraste o convite lá tive eu que beber o teu copo… Mas amanhã já lhe posso dizer que afinal tu não estavas a ignorar o Parvo mas sim a ti próprio. É que ele levou a coisa a peito sabes.
– Bem… humm… Mudando de assunto. Por que razão te chamou ele burro.
– Pois… agora que penso bem, acho que na verdade o insulto não foi para mim…

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